Ásia
Indonésia
Indonésia em família
Chegamos ao aeroporto de Denpasar, na Ilha de Bali, no começo da noite. Esperamos uma eternidade nossas bagagens e as colocamos no carrinho. A saída da sala de desembarque teve um sabor familiar. A sensação que muitos conhecem: empurrar o carrinho pela porta automática e começar a procurar um rosto conhecido em meio a uma pequena aglomeração de pessoas igualmente atentas. Era como se estivéssemos voltando para casa. Esse sentimento, mesmo do outro lado do mundo, foi proporcionado pelo fato de que sabíamos que meu irmão, Alexandre, e Dani estariam nos esperando. O aeroporto de Denpasar tinha ganhado um sabor de Galeão.
Após mais de um ano sem nos vermos, finalmente pude abraçar meu irmão. Um reencontro inesquecível. Foi muito bom vê-los bem. Olhando para Alexandre, parecia que estivéramos sempre juntos. Mais um ponto para a internet: apesar do tempo e da distância, parecia que tínhamos nos visto sempre nos últimos meses. Foram incontáveis as trocas de emails e conversas pelo skype. Como é mais fácil viajar nos dias de hoje. Mas como era bom estar novamente lado a lado.
O bafo quente da rua mostrou de cara qual seria o clima durante a visita por Bali: um calor úmido e desgastante. Achamos um táxi e partimos para nosso hotel em Kuta, uma cidade a poucos minutos do aeroporto. Saímos para jantar e começamos a ouvir e contar histórias. Parecia que não haveria tempo suficiente, nos quase três meses que passaríamos juntos, para tantos casos. Notícias do Brasil e do mundo. Contávamos sobre os terremotos na Nova Zelândia, falávamos sobre revolta árabe e sobre a África, além das novidades e fotos da recente viagem deles de carro por Chile e Argentina. Era bom saber que muitos jantares como aqueles estavam no nosso roteiro.
A estadia em Kuta foi rápida. Passamos somente dois dias, aproveitando para preparar o roteiro por Bali. Alugamos um carro para nos aventurarmos no trânsito caótico da ilha e com ele visitamos o Templo Uluwatu e a praia de Padang Padang. No templo, a Du novamente se fartou de fotografar e interagir com os macacos, mas dessa vez não foi assim tão legal. Ela estava com um no colo quando outro apareceu e começou uma briga. Resultado: a Du acabou mordida de leve por um deles. A ferida não era nada demais, mas o medo de contrair raiva nos levou na manhã seguinte a uma clínica para ela tomar vacina. Tínhamos tomado uma dose preventiva no Brasil, o que se mostrou uma boa política, pois a dosagem de reforço era bem mais simples do que se ela não tivesse tomado nada. Voltando, ainda no templo, a cena engraçada ficou por conta de um macaco que cismou em roubar as sandálias horrorosas que uma menina usava. As sandálias tinham umas bolotas brancas, que faziam com que ela parecesse um cacho de uvas albinas, e o macaco cismou que queria provar algumas. Ele partiu pra cima dela, totalmente alheio aos berros da menina. Foi hilário.
Padang Padang impressionou na chegada, quando avistamos suas águas claras. A descida para a praia é igualmente interessante, por sua estreita passagem por entre as pedras. Mas o melhor estava à frente: a temperatura da água era inigualável.
Saímos de Kuta com destino ao litoral leste, mais especificamente para a cidade de Tulambem. O caminho foi fascinante. A vida à beira da estrada e a agitação do trânsito, lotado de scooters, eram muito interessantes e nos divertiram. No caminho para o litoral pudemos apreciar e fotografar os primeiros campos de arroz. O cair da tarde trouxe uma fina chuva que nos fez entender como tal cenário poderia ser tão verde. Não havia um espaço sequer sem preenchimento.
Tulambem é uma cidade pequena e bem turística, criada basicamente nos arredores de alguns poucos quilômetros de estrada. Nessa mesma estrada, a quantidade de operadoras de mergulho deixava claro qual o apelo turístico da cidade. Além da água clara e quente, um grande naufrágio garantia o divertimento debaixo d’água. Paramos em uma operadora e pegamos o pacote completo: mergulho e estadia.
O mais difícil foi entender onde eles queriam hospedar a gente. O figura mandou: “Vocês podem ficar na Pila!”. Nos entreolhamos, e chegamos a óbvia conclusão de que "Pila" era alguma outra cidade ou vilarejo. “Sei... Mas vocês têm um hotel por lá?”. “Não, em Pila!”, riu o nosso agente para assuntos de mergulho e estadia. “Meu amigo, se for perto e tiver um hotel ou uma pousada boa a gente vai. Eu só quero saber o que tem lá!”. Ele começou a repetir “Pila! Pila! Pila!”, enquanto pegava um papel de propaganda do lugar. Na verdade eles estava querendo dizer “Villa” que, como já tínhamos visto na internet, era uma espécie de casa transformada em pousada. “Ah... Por quê não falou antes?!”, perguntamos rindo.
O lugar era fantástico! Ficamos felizes da vida em um quarto extremamente confortável e de frente para o mar, na nossa nova “Pila”. Jantamos bem e eu e a Du nos preparamos para mergulhar no naufrágio na manhã seguinte.
A saída para o mergulho foi tão simples que parecia impossível ser bom. Saímos da própria operadora, prontos para o mergulho, de roupa e com máscaras e nadadeiras na mão. Andamos em direção à praia em frente, onde os cilindros nos aguardavam em cima de uma mesa de madeira. As lembranças dos mergulhos nesse estilo que fizemos no Mar Vermelho, com seus corais completamente destruídos, foram inevitáveis. Esperávamos que a natureza aqui desfrutasse de mais sorte.
E era verdade. O mergulho foi inesquecível. Um dos melhores que já fizemos. Já na descida, rumo ao naufrágio, uma barracuda imensa descansava próxima às chapas de aço, que por sua vez eram recobertas de corais e rodeadas de vida. Para onde olhássemos víamos algo de interessante. A dose de adrenalina ficou por conta de um tubarão galha-branca de quase dois metros de comprimento que passou do nosso lado. Ele veio em sentido contrário e não mudou muito o ritmo quando passou por nós, dando tempo para uma rápida foto. Quase consegui ouvir o coração da Du. Para melhorar ainda mais, ele deu uma meia volta e resolveu nos “checar”. Nadou um pouco em nossa direção e fez novo retorno, garantido as risadas nervosas dentro da máscara.
Continuamos nadando e curtindo a paisagem. Uma emoção a mais ficou por conta do regulador da Du, que se soltou e a deixou sem ar. Ela se virou bem e agarrou o reserva, exatamente no momento em que o guia chegava correndo nela. Por coincidência eu estava filmando, e toda essa movimentação ficou gravada.
Já próximo ao final do mergulho, outro espetáculo da natureza nos fez parar por cinco minutos para observar e registrar: um cardume de incontáveis atuns. Milhares, grandes e calmos. Pareciam totalmente integrados com o bicho homem, pois podíamos nadar no meio deles sem alterar a paz local.
Voltamos ainda no final da manhã para nossa “Pila”, felizes da vida com nosso mergulho de boas-vindas. O resto do dia foi de descanso, massagem e bate papo com Alex e Dani.
Depois de Tulambem voltamos ao interior, em direção à mais famosa cidade de Bali, Ubud. Ubud é incrível, apesar de muito turística. Aproveitando novamente os baixos preços locais ficamos em um excelente hotel, com um quarto do tamanho de um apartamento e com uma vista impressionante para um campo de arroz. A fotógrafa, na verdade, agora, os fotógrafos, já que Alex e Dani também vieram obstinados a registrar cada centímetro da viagem, nem precisavam sair da varanda do quarto para conseguirem imagens impressionantes.
Após a primeira noite, muito bem dormida, acordamos com as notícias do terremoto devastador que tinha atingido o Japão. Ainda não sabíamos da dimensão do problema por lá, mas a nossa natural reação foi ficarmos preocupados com nossa segurança, principalmente com as lembranças do tsunami devastador de dezembro de 2004. Depois de mandarmos notícias de que estávamos bem, prometemos ao pessoal no Brasil que continuaríamos no interior da ilha durante os dias seguintes, de olho nos acontecimentos. Do alto de Ubud, acompanhamos aliviados as notícias de que o risco de tsunamis era quase zero pela nossa área, mas ficamos, juntos com o resto do mundo, chocados com a triste destruição no Japão. Além disso, o risco de tsunamis deu lugar a um risco de vazamento de material radioativo. Nosso próximo destino era o Vietnã, mais perto do Japão do que a Indonésia, e precisávamos entender se era seguro. Com o tempo e com as notícias, vimos que estávamos fora de risco.
Ainda em Ubud visitamos a Floresta dos Macacos. Assim como em Kuta, os primatas são atração e diversão garantidas. Dessa vez a Du ficou fotografando de longe.
Enquanto a Du e a Dani aproveitavam as incontáveis lojas de traquitanas, eu e Alex fomos para a piscina do hotel, aproveitando o calor para mais uma Bintang, a boa cerveja local.
Reservamos o dia seguinte para um famoso programa da região: um curso de culinária. É imperdível. É tudo feito por gente muito simples, imbuídas de um espírito de tornar seu tempo o mais agradável e interessante possível. O curso começa realmente no início de uma refeição: no mercado, onde fomos apresentados aos alimentos locais, aos comerciantes e a sua forma de vender. O curso teve sequência na própria casa dos responsáveis, onde efetivamente preparamos o almoço e aprendemos muito sobre os hábitos locais e sobre a história do pequeno vilarejo onde eles moram. O tempo passou rápido e a comida, obviamente, ficou fantástica.
No início da noite, algo chamou muito minha atenção: a vigilância estava extremamente agitada. No nosso “quintal”, a plantação de arroz, o que mais se via eram feixes de lanternas procurando algo, como se houvesse presos em fuga. Perguntei na recepção e ouvi um “é normal” rodeado por um sorriso meio amarelo. Não satisfeito, abordei com Alex um dos seguranças que respondeu secamente: “No speak english”. Pronto, lembrei logo dos atentados terroristas a Bali no passado e imaginei que estava rolando uma espécie de sinal laranja. Portas trancadas, última olhada no arrozal e cama. Felizmente tudo amanheceu bem.
Saímos de Ubud e pegamos a estrada, novamente em direção ao litoral. O risco de tsunamis tinha desaparecido por completo, então seguimos confiantes para as praias do Norte. Novamente as estradas se mostraram bem agradáveis, apesar de muito estreitas, e a recepção dos balineses cada vez mais calorosa. Mais alguns templos fizeram parte do nosso roteiro.
Chegamos à cidade de Lovina e não precisamos perder muito tempo procurando hotel, pois a oferta era grande. O calor era forte, então a piscina existente veio bem a calhar. O dia seguinte foi reservado para mais um mergulho. Não foi tão fácil e prático como o mergulho em Tulambem, onde simplesmente caminhamos para a praia – dessa vez foram duas horas de van e mais uma de barco. Isso para chegar à ilha de Menjangan. O caminho foi bem descontraído. O trânsito balinês surpreende: primeiro, pelo caos gerado pela quantidade de veículos, principalmente scooters. Segundo, pela calma e cordialidade. Apesar de algumas buzinas serem bem estridentes, você não sente agressividade no trânsito. Além de tudo, eles mantêm uma velocidade incrivelmente baixa.
Van, barco, ilha – chegamos ao parque marinho Menjangan. Cilindros a postos... Água! A expectativa era grande, devido ao excelente mergulho em Tulambem, mas ela foi um pouco frustrada. Apesar de termos visto alguma vida, não presenciamos nada de muito extraordinário. Além de tudo, uma correnteza fenomenal tomou boa parte do nosso fôlego. E o guia não se preocupava muito com o grupo. Não se preocupava com a gente e muito menos com uma turista visivelmente iniciante que flutuava igual a um balão na superfície, tentando desesperadamente descer. Em vão. Ela acabou passando a maior parte do mergulho esquentando o cilindro no sol.
O caminho de volta foi igualmente tranquilo, valendo até um cochilo na van. Não foi o melhor mergulho da vida, mas chegamos ao hotel relaxados pelo bom passeio.
Jantamos os quatro em um restaurante próximo ao hotel, com direito a apresentação de dança e tudo. Tudo tão turístico que chegava a ser engraçado.
Saímos de Lovina novamente em direção a Kuta. Nosso ponto de chegada seria o mesmo da saída. A visita a Bali e à Indonésia estava terminando. Estávamos os quatro felizes por essa nossa viagem estar somente começando. Fomos jantar, nos despedimos das Bintangs e dormimos cedo. O dia seguinte seria de aeroporto e voos. Vamos à nossa primeira república comunista: o Vietnã.